CPLE6: A nova Copel em análise

Transformação pós-privatização, política de dividendos e desafios de governança e alavancagem.

A Companhia Paranaense de Energia (CPLE6) se encontra em um período de profunda transformação estratégica após sua privatização em 2023. A tese de investimento central aponta para um potencial significativo de valorização, fundamentado em uma gestão orientada para a eficiência, uma política de dividendos robusta e a iminente migração para o Novo Mercado da B3. Tais iniciativas visam alinhar a companhia aos interesses dos acionistas privados, impulsionando a criação de valor a médio e longo prazo.

Os principais destaques do relatório incluem a performance financeira resiliente da empresa, a nova política de distribuição de proventos com payout mínimo de 75%, e a importância da migração para o Novo Mercado, que deve aprimorar a governança e a liquidez da ação. Contudo, a análise também identifica e pondera riscos emergentes, como a deterioração inicial da qualidade do serviço de distribuição, a tendência de aumento da alavancagem financeira da companhia e a complexa dinâmica imposta pela manutenção da golden share por parte do governo do Paraná. A avaliação final conclui que os múltiplos de avaliação atrativos e a estratégia de otimização de valor superam os desafios identificados, justificando uma recomendação de "Compra" para a CPLE6.

Perfil da Companhia e Análise Operacional Pós-Privatização

Visão Geral da Companhia e seu Core Business

Fundada em 1954, a Copel (Companhia Paranaense de Energia) se estabeleceu como uma das maiores e mais importantes empresas do setor elétrico brasileiro. Sua atuação é diversificada e integrada, abrangendo os segmentos de geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica. A empresa opera 46 usinas de geração e conta com uma extensa rede de transmissão de mais de 6.700 km, com presença física em 10 estados e vendas em 24. No segmento de distribuição, a Copel atende mais de 4,7 milhões de clientes no Paraná, com uma rede de mais de 200 mil km. Adicionalmente, a empresa possui um papel de vanguarda no Ambiente de Contratação Livre (ACL), tendo sido a primeira no Brasil a vender energia para consumidores livres em 1999.

A Estratégia de Foco e Crescimento

A privatização da Copel, concluída em 2023, representou mais do que uma mera mudança de controle; foi um catalisador para uma reorientação estratégica profunda da companhia. A gestão, agora operando sob uma lógica de corporação, tem se concentrado na busca por maior eficiência de capital e rentabilidade, alinhando-se aos interesses dos novos acionistas privados.

Uma das primeiras ações concretas dessa nova estratégia foi a alienação de ativos considerados não estratégicos, como pequenas centrais hidrelétricas, uma termelétrica e um parque eólico, que foram vendidos por um valor de R$ 450,5 milhões. Em contrapartida, a empresa tem direcionado seus investimentos para seu core business, com destaque para o segmento de distribuição, onde a previsão de investimento para 2025 é de R$ 2,5 bilhões. Essa movimentação demonstra uma clara preferência por otimizar a operação nas áreas de maior rentabilidade e escala.

A Copel também tem capitalizado sua posição de liderança no Mercado Livre de Energia. Com a entrada em vigor de novas regras que permitem a migração de todos os consumidores de alta e média tensão (Grupo A) para o Ambiente de Contratação Livre (ACL) a partir de janeiro de 2024, a empresa está estrategicamente posicionada para expandir sua carteira de clientes. A Copel Mercado Livre já atende a mais de 1.500 clientes em 22 estados e o Distrito Federal, com um modelo de negócio simplificado que assume as obrigações dos consumidores varejistas perante a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), o que torna a adesão mais fácil para pequenas e médias empresas.

Desempenho Financeiro, Valuation e Rentabilidade

Análise dos Resultados Financeiros Recentes

A Copel tem reportado resultados financeiros sólidos, refletindo a melhoria operacional e o crescimento da receita. No 4T24, o EBITDA ajustado foi de R$ 1,256 bilhão, resultando em um payout de 86% para o ano fiscal.

A análise do 1T25, por sua vez, exige a ponderação de diferentes fontes. Enquanto um relatório aponta para um lucro líquido de R$ 577 milhões e um EBITDA de R$ 1,5 bilhão, outro reporta um lucro líquido maior, de R$ 664,7 milhões, com um EBITDA de R$ 1,736 bilhão. As discrepâncias nos valores de lucro líquido e EBITDA podem ser atribuídas a metodologias de ajuste e recorrentes distintas utilizadas por diferentes analistas. No entanto, o ponto convergente é a clara tendência de crescimento e a melhoria de margens, uma vez que a alta de receita (+9%) foi superior ao aumento dos custos operacionais (+3%).

No 2T25, a empresa manteve o bom desempenho, com um lucro líquido de R$ 573,6 milhões, crescimento de 21,1% em relação ao mesmo período do ano anterior, impulsionado por ganhos com a venda de ativos. O EBITDA recorrente atingiu R$ 1,33 bilhão, avançando 4,2% na comparação anual.

Indicadores de Valuation e Endividamento

A Copel negocia com múltiplos que, em alguns casos, são superiores à média do setor de energia elétrica, o que pode refletir as expectativas do mercado em relação à sua nova gestão e a política de dividendos.

A Tabela 1 abaixo apresenta uma comparação dos principais indicadores de valuation da Copel em relação à média do seu setor de atuação:

Tabela 1: Indicadores Fundamentais da CPLE6 vs. Setor de Energia Elétrica

Indicador

CPLE6

SetorP/L

P/L

11,86

7,77

P/VP

1,41

1,30

Dividend Yield (DY)

6,78%

3,49%

ROE

11,89%

14,82%

A rentabilidade histórica da ação tem sido notável, demonstrando um desempenho consistente ao longo do tempo. Conforme a Tabela 2, a rentabilidade acumulada nos últimos 5 anos foi de 571,38%, o que representa uma rentabilidade real, já descontada a inflação, de 300,17%.

Tabela 2: Rentabilidade Histórica da CPLE6

Período

Rentabilidade

Rentabilidade Real

1 Mês

-2,97%

-3,22%

3 Meses

22,26%

16,68%

1 Ano

54,98%

41,64%

2 Anos

200,71%

121,14%

5 Anos

571,38%

300,17%

Apesar dos resultados operacionais positivos, a análise do endividamento da Copel aponta para um risco crescente que merece atenção. A nova política de dividendos, que estabelece um payout mínimo de 75% do lucro líquido, condiciona essa distribuição a um nível de alavancagem ótima de 2,8 vezes a Dívida Líquida/EBITDA, com uma faixa de tolerância que vai até 3,1x. No entanto, a Tabela 3 mostra que a dívida tem aumentado rapidamente, já ultrapassando esse limite.

Tabela 3: Histórico de Alavancagem (Dívida Líquida/EBITDA)

Período

Dívida Líquida/EBITDA

2023

1,9x

4T24

2,6x

1T25

2,3x

2T25

3,1x

A evolução da alavancagem de 1,9x para 3,1x em menos de um ano representa um ponto de atenção crucial. O rápido aumento do endividamento para um patamar acima da faixa de tolerância da política de dividendos sugere que a sustentabilidade do alto payout de proventos pode estar sob pressão se a empresa não conseguir reduzir sua dívida líquida no futuro. Este fator pode impactar a percepção dos investidores e a atratividade da ação, apesar do atrativo retorno em dividendos.

Governança Corporativa e a Questão da Transição

Consequências da Privatização na Qualidade do Serviço

A privatização da Copel, embora estratégica do ponto de vista financeiro, tem gerado impactos negativos na qualidade do serviço de distribuição. A empresa, que outrora foi reconhecida como uma das melhores distribuidoras do Brasil, tem apresentado uma queda expressiva nos rankings de Desempenho Global de Continuidade (DGC) da ANEEL. A companhia despencou da 10ª posição em 2021 para a 29ª em 2024, entre 31 concessionárias.

A deterioração da qualidade do serviço é confirmada pelo aumento de reclamações dos consumidores, bem como pelo salto nas multas aplicadas pela ANEEL por falhas no fornecimento e variações de tensão na rede. A situação é atribuída, por dirigentes sindicais e parlamentares, à priorização do lucro em detrimento da qualidade do serviço e à adoção de programas de demissão voluntária.

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A Migração para o Novo Mercado e a Unificação das Ações

Em um movimento que busca sinalizar um compromisso com a melhoria da governança e a atração de capital, a Copel aprovou em Assembleia Geral Extraordinária a unificação de suas ações e o processo de migração para o Novo Mercado da B3. O cronograma prevê a conclusão no quarto trimestre de 2025.

O processo é complexo e envolve a conversão das ações preferenciais classe B (PNB) em preferenciais classe A (PNA), antes da transformação final em uma ação ordinária (ON) e uma ação preferencial classe C (PNC), que será resgatável em dinheiro. Essa transição é vista como positiva, com potenciais ganhos de liquidez e maior atratividade para investidores, em especial os estrangeiros.

O Papel da "Golden Share" do Governo do Paraná

Apesar dos esforços de alinhamento ao mercado, a presença da golden share do governo do Paraná na Copel representa um risco de governança fundamental. A golden share é um tipo de ação que confere a seu detentor poder de veto sobre decisões estratégicas da companhia, mesmo com uma participação minoritária. No contexto de uma privatização, ela é frequentemente utilizada para permitir que o Estado mantenha o controle sobre ações consideradas de interesse nacional ou de política pública, como ocorre com a fabricante de aeronaves Embraer.

A coexistência da golden share e da migração para o Novo Mercado cria uma dualidade crítica. Enquanto a empresa busca sinalizar transparência e alinhamento com as melhores práticas de mercado, a possibilidade de intervenção do Estado do Paraná em decisões estratégicas permanece, distinguindo a Copel de uma companhia 100% privada e impondo um teto de risco político/regulatório que deve ser considerado pelo investidor.

Análise do Setor Elétrico e Perspectivas de Mercado para 2025

O Cenário Macroeconômico e o Ambiente de Negócios

O setor de energia no Brasil caminha para 2025 com um cenário de oportunidades e riscos. A principal oportunidade é a expansão do Ambiente de Contratação Livre (ACL), que permite a migração de todos os consumidores de alta e média tensão para o mercado livre a partir de janeiro de 2024, impulsionando a comercialização. O crescimento das fontes renováveis, como solar e eólica, também contribui para a diversificação da matriz energética nacional.

No entanto, o setor enfrenta desafios significativos. A dependência histórica das hidrelétricas expõe a matriz energética às mudanças climáticas e à escassez hídrica. Adicionalmente, o crescimento desordenado da geração solar e eólica tem gerado um excesso de energia durante o dia, levando a ordens de "curtailment" (cortes de produção) e, paradoxalmente, a um crescente risco de falta de suprimento no pico de demanda noturno, conforme alertado pelo Operador Nacional do Setor Elétrico (ONS). Esse desequilíbrio demanda investimentos urgentes em infraestrutura de transmissão e armazenamento de energia.

Posicionamento Estratégico da Copel

A Copel tem se posicionado ativamente para capitalizar as tendências do setor. Sua atuação consolidada no Ambiente de Contratação Livre (ACL) a beneficia diretamente com a expansão regulatória, permitindo que a empresa atraia a nova onda de consumidores livres, especialmente pequenas e médias empresas. Além disso, a diversificação de seu portfólio de geração, com forte presença em usinas eólicas e hidrelétricas, alinha a companhia à transição energética para fontes renováveis.

Apesar do posicionamento estratégico, a empresa não está imune aos riscos sistêmicos da indústria. A estratégia de crescimento no mercado livre e em fontes renováveis a expõe aos desafios de instabilidade da rede e ao risco de "curtailment", que podem afetar a operação e os resultados de toda a cadeia de energia. A análise da empresa deve, portanto, levar em conta não apenas sua capacidade de execução, mas também os desafios do cenário macro do setor.

Tese de Investimento e Conclusão

Pontos Fortes e a Tese Bullish

A tese de investimento na CPLE6 é sustentada por uma série de fatores positivos:

  • Estratégia Pós-Privatização: A nova gestão demonstra um foco claro em eficiência e na otimização do core business, com desinvestimento em ativos não estratégicos e aumento de capital nas áreas de maior rentabilidade.

  • Política de Dividendos Atrativa: O compromisso de distribuir um payout mínimo de 75% do lucro líquido torna a ação altamente interessante para investidores focados em renda.

  • Aprimoramento da Governança: A migração para o Novo Mercado da B3, com cronograma previsto para o 4T25, deve aumentar a liquidez e a transparência da ação, tornando-a mais atrativa para um público mais amplo de investidores, incluindo os estrangeiros.

  • Posição no Mercado Livre: A Copel está estrategicamente posicionada para se beneficiar da expansão regulatória do Ambiente de Contratação Livre (ACL), um dos segmentos de maior crescimento no setor.

Pontos de Atenção e a Tese Bearish

Em contrapartida, a tese de investimento enfrenta desafios relevantes:

  • Deterioração da Qualidade do Serviço: A queda nos rankings de satisfação e a priorização do lucro sobre a qualidade do serviço representam um risco de reputação e regulatório.

  • Aumento da Alavancagem: A dívida líquida da empresa tem crescido rapidamente, já superando o limite superior da faixa de tolerância de sua própria política de dividendos. Este é um risco fundamental para a sustentabilidade do modelo de alta remuneração.

  • Risco de Governança: A presença da golden share nas mãos do governo do Paraná mantém a possibilidade de intervenção em decisões estratégicas, o que pode entrar em conflito com os interesses dos acionistas privados.

  • Riscos Setoriais: A empresa, apesar de bem posicionada, não é imune aos desafios sistêmicos do setor, como a instabilidade da rede e a volatilidade hídrica.

Conclusão e Recomendação Final

A análise da CPLE6 revela uma assimetria positiva de risco/retorno. O processo de privatização, a nova política de dividendos e a migração para o Novo Mercado criam um potencial de valorização considerável, fundamentado na busca por maior eficiência e rentabilidade. Embora os múltiplos de valuation da Copel estejam acima da média do setor, a empresa justifica tal prêmio através de uma rentabilidade histórica expressiva e um potencial de crescimento sólido.

Apesar da presença de riscos importantes, como a queda na qualidade do serviço e, principalmente, o rápido aumento do endividamento, a tese de que a nova gestão focará em reverter esses quadros é vista como crível. Dessa forma, a recomendação final para a ação CPLE6 é de Compra, com um preço-alvo de R$ 13,86, conforme a média de analistas de mercado. O investidor é aconselhado a monitorar de perto a evolução da alavancagem da companhia e seu desempenho nos rankings de qualidade da ANEEL, pois esses indicadores serão essenciais para avaliar a sustentabilidade do modelo de negócio pós-privatização.

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